O enfisema pulmonar é uma patologia crônica caracterizada pela destruição tecidual dos pulmões o que os torna hiperinsuflados. Há uma dilatação permanente dos espaços aéreos distalmente aos bronquíolos terminais devido à destruição das paredes das vias aéreas, sem fibrose evidente. Esta doença quase sempre está associada à bronquite crônica, e ambas causam obstrução ao fluxo de ar nas vias aéreas resultando em doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Geralmente a bronquite crônica é a principal causa de obstrução, porém, em alguns casos, o enfisema pode predominar. Frequentemente a obstrução ao fluxo de ar é progressiva, e pode vir acompanhada por hiper-responsividade brônquica e ser parcialmente reversível. O termo DPOC é utilizado para definir o complexo evolutivo da bronquite e do enfisema pulmonar, pois apresentam características fisiopatológicas, funcionais e clínicas comuns, onde a principal expressão é a limitação crônica ao fluxo de ar na expiração.
“A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é o distúrbio pulmonar crônico mais comum afetando de 10 a 15% dos adultos com mais de 55 anos [...]”.
O enfisema pulmonar apresenta uma maior incidência em pessoas do sexo masculino e de raça branca, o que pode ter relação com fatores genéticos. Existem aproximadamente 14 milhões de indivíduos portadores de DPOC, nos EUA, e uma taxa de enfisema de 4 a 6% em homens adultos e de 1 a 3% em mulheres adultas. Pesquisas apontam que 2/3 de todas as autópsias, em homens, e 1/7, nas mulheres, mostram sinais claros de enfisema pulmonar.
Como é nas unidades alveolares que ocorre as trocas gasosas, e estas, no enfisema, são feitas de maneira insatisfatória reduzindo a quantidade de oxigênio disponível na corrente sanguínea, o indivíduo apresenta falta de ar ao realizar tarefas ou exercícios. Há perda da elasticidade pulmonar, tornando mais difícil a saída de ar durante a expiração. Quando 50% do parênquima pulmonar está comprometido, é que surge a falta de ar.
Fisiopatologia
Diante da exposição prolongada do indivíduo a substâncias patógenas ocorre uma inflamação crônica fazendo com que haja um desequilíbrio entre proteases e anti-proteases no parênquima pulmonar. Sendo assim, qualquer fator que aumente as proteases, principalmente a elastase, e/ou iniba ou reduza a antielastase, promove a destruição do arcabouço elástico do pulmão. A mais importante antielastase é a alfa-1-antripsina, e a principal fonte de elastase são os neutrófilos, que encontram-se elevados, junto com os macrófagos, no tabagismo. O mecanismo de destruição pulmonar ocorre da seguinte maneira: os macrófagos são anormais em fumantes e destroem o tecido pulmonar, além disso, os leucócitos que combatem a infecção pulmonar estão alterados e liberam enzimas que também realizam esta função, e ainda a alfa-1-antitripsina, que funciona defendendo o tecido pulmonar contra essas enzimas, encontra-se inativa pela ação de oxidantes liberados pela fumaça do cigarro e pela ação dos leucócitos anormais.
As glândulas das paredes brônquicas se hipertrofiam e produzem grande quantidade de secreções que obstruem de maneira parcial ou total as vias aéreas. Isto faz com que durante a inspiração o ar passe em torno das secreções, contudo na expiração apenas uma parte do ar escapa antes que a via aérea se feche, causando um aprisionamento de ar distal à obstrução, e consequentemente uma hiperinsuflação, que é a elevação anormal da quantidade de ar dentro do tecido pulmonar. O acúmulo de secreções aumenta a probabilidade do paciente apresentar infecções respiratórias, e a destruição do tecido pulmonar causa perda das propriedades elásticas dos pulmões, com queda da pressão interna das vias aéreas, contribuindo ainda mais para o aprisionamento de ar e diminuição nas taxas de fluxo expiratório.
Etiologia
O enfisema pulmonar pode ser congênito (ou primário), causado pela deficiência da alfa-1-antitripsina, ou ser secundário a outros fatores como, uma outra patologia das vias aéreas (asma, fibrose cística e bronquite crônica), por doenças pulmonares ocupacionais e pelo hábito de fumar6. À medida que os indivíduos fumam há uma perda gradativa na sua capacidade pulmonar, e geralmente essa perda só começa após vários anos do início do fumo4. Este é o principal fator de risco para o surgimento da DPOC, estando presente em 80 a 90% dos casos. A deficiência da alfa-1-antitripsina é responsável por menos de 1% dos casos de DPOC.
O enfisema pulmonar pode ser secundário a outro fator, como ser compensatório à uma contração devido a uma secção do pulmão.
Classificação
O enfisema pulmonar apresenta, de acordo com a distribuição anatômica dentro do lóbulo, classificações morfológicas, que são: enfisema centrolobular, que é o mais comum e ocorre nas partes centrais dos lóbulos, envolvendo os bronquíolos respiratórios e poupando os alvéolos distais; enfisema panlobular, que acomete os lóbulos de maneira uniforme, onde estes encontram-se dilatados do bronquíolo terminal aos alvéolos distais, ocorre mais nos lobos inferiores e geralmente está associado a deficiência da alfa-1-antitripsina; enfisema parasseptal, apresenta dilatação da porção mais distal do ácino, havendo preservação da parte proximal; enfisema irregular, neste tipo o ácino é atingido irregularmente e sempre está associado a regiões de fibrose, geralmente é assintomático.
O enfisema centrolobular geralmente acomete as regiões mais superiores do pulmão, causando grande alteração na relação ventilação-perfusão, pois o suprimento de sangue está relativamente preservado para os alvéolos, mas o oxigênio que chega aos capilares é reduzido devido aos danos nas vias aéreas proximais. Como o enfisema panacinar afeta mais os lobos inferiores, seu efeito é menos drástico na relação ventilação-perfusão, pois o suprimento sanguíneo reduz à medida que há a diminuição da ventilação nessas regiões.
Quadro clínico
O enfisema pulmonar apresenta como características clínicas a dispnéia progressiva, que inicialmente ocorre aos exercícios e com o progredir da doença surge até no repouso, tornando o paciente incapaz de trabalhar; um padrão respiratório alterado, com o movimento da boca tipo “peixe” na inspiração, e a expiração é forçada e prolongada; tosse com secreção, nos casos de associação com bronquite crônica ou infecção; pode ocorrer retrações supraclaviculares e intercostais; cifose torácica, pela hiperinsuflação pulmonar; policitemia; e cor pulmonale, em estágios mais avançados.
Geralmente o paciente assume uma posição sentada com inclinação do corpo para frente, e com os braços apoiados, favorecendo uma vantagem mecânica para os músculos acessórios da inspiração, devido ao tórax hiperinsuflado oferecer uma baixa reserva inspiratória.
O aumento do tórax ocorre ântero-posteriormente devido à perda da retração elástica dos pulmões, causando uma cifose torácica e dando ao tórax do paciente uma aparência de “tórax em barril”. Os sons respiratórios e cardíacos apresentam-se espaçados e com certa dificuldade de serem audíveis devido à hiperinsuflação pulmonar. Também podem ocorrer sibilos respiratórios, e em estágios mais avançados hipertrofia de músculos acessórios da ventilação, cianose e baqueteamento digital. O aumento do diâmetro longitudinal do tórax e a horizontalização das cúpulas diafragmáticas também podem ocorrer no indivíduo com enfisema a fim de acomodar o pulmão doente. Sendo assim, átrios e ventrículos podem ser comprimidos pelos pulmões prejudicando a diástole cardíaca e causando consequentemente a diminuição do retorno venoso, da tensão de oxigênio e do débito cardíaco.
Há também um aumento do trabalho expiratório devido à elevação da resistência das vias aéreas, que junto com a hiperinsuflação levam o paciente à fadiga muscular. As alterações na relação ventilação perfusão causam hipoxemia e hipercapnia.
Nos tabagistas o enfisema pulmonar aparece em torno dos 65 anos de idade e o principal sintoma é a falta de ar, que no início da doença é notada nos grandes e médios esforços, como subir escadas e caminhar, e posteriormente, com a continuação do hábito de fumar, a falta de ar surge aos pequenos esforços, como banhar-se ou vestir-se, tornando-se cada vez mais incapacitados para o trabalho. Também podem ocorrer como sintomas a tosse e o chiado no peito. Quando há a deficiência da alfa-1-antitripsina esta doença aparece mais cedo mesmo na ausência do tabagismo.
A perda de peso, devido à redução na ingestão de alimentos também pode estar presente, além da hipotrofia dos músculos acessórios da respiração e a ocorrência de pele arroxeada.
Nos casos avançados o paciente pode vir a óbito por complicações importantes, como falência respiratória, acidose, Cor pulmonale, insuficiência ventricular, coma e colapso pulmonar maciço por pneumotórax resultante da ruptura de bolhas subpleurais. A insuficiência respiratória ocorre devido a redução do fluxo aéreo (causado pela diminuição da elasticidade pulmonar e deformidade bronquiolar), dificuldade do ar inspirado chegar às paredes alveolares pela elevação do ar residual e queda da área de superfície para as trocas gasosas por destruição da parede dos alvéolos.
Diagnóstico
Na maioria dos casos o diagnóstico é feito a partir da longa exposição ao tabaco, relatada pelo paciente, associado às queixas e ao exame físico. Exames complementares como a tomografia computadorizada, a radiografia torácica, exame de sangue, a dosagem da alfa-1-antitripsinana no sangue e a espirometria podem ser feitos para auxiliar no diagnóstico e na decisão de um melhor tratamento para cada paciente.
Segundo Enfisema Pulmonar9 “O RX de tórax representa um grande recurso diagnóstico para o enfisema quando as lesões encontram-se moderadamente acentuadas”.
O raio X de tórax é indicado sempre que há suspeitas de alguma anormalidade pulmonar. Sua qualidade e utilidade diagnóstica dependem das condições sob as quais o exame foi realizado, como, a projeção, a orientação do paciente em relação ao chassi, a distância entre o filme e o aparelho de raio X, e outras. O Raio X de tórax ideal mostra uma imagem de estruturas dentro do tórax durante a exposição do paciente à menor dose possível de radiação. Durante o exame o feixe de raios X é modificado a partir das estruturas pelas quais ele passa. Os fótons passam através do paciente e carregam informações que são convertidas para a forma visual13.
A tomografia computadorizada depende do mesmo princípio físico básico da radiografia convencional que é a absorção de raios X por tecidos de variadas densidades. A TC produz finos cortes do parênquima pulmonar de grande resolução mostrando a complexa morfologia de muitas patologias pulmonares intersticiais a serem definidas. As indicações para este tipo de exame no tórax podem ser: avaliar massas no hilo ou mediastino suspeitas no raio X; tirar conclusões sobre a natureza da massa ou lesão cavitacional; em casos de raio X normal, porém testes funcionais pulmonares alterados; e avaliação de indicação cirúrgica e das respostas ao tratamento em pacientes neoplásicos.
A presença de alterações nos vasos pulmonares e de bolhas (Figuras 1.A e 1.B) ao raio X de um paciente com enfisema também podem ocorrer. Os vasos pulmonares anormais podem apresentar uma leve graduação no tamanho dos vasos hilares para fora que encontra-se perdida, onde estes ficam maiores e afilam-se de maneira abrupta, é o que se chama de “podação dos vasos”. Geralmente os pulmões estão irregularmente afetados, o que causa uma distribuição irregular dos vasos pulmonares. Nos casos em que o enfisema pulmonar atinge predominantemente as bases, há um desvio proeminente de sangue para o lobo superior, isto não pode ser confundido por uma evidência de insuficiência cardíaca esquerda. As bolhas são radiotransparentes, apresentam paredes muito finas e variam de tamanho (quando grandes causam importante desconforto respiratório). Os vasos pulmonares adjacentes às bolhas encontram-se distorcidos.
A formação de bolhas pode ter como complicações a infecção e a hemorragia.
Figura 1: Enfisema pulmonar. A. Rx onde ambos os pulmões apresentam hiperinsuflação;
Fonte: COLLINS; HANSELL, 2002, p 37.
Macroscopicamente o pulmão apresenta-se pálido, fofo e inelástico. Já ao microscópio há dilatação permanente dos alvéolos, ductos e sacos alveolares, obstrução de pequenos canais aéreos (que causa estenose e deformidade dos bronquíolos), e as lesões vasculares, com diminuição da rede capilar e lesões arteriolares decorrentes da hipertensão pulmonar. Esta é causada pela redução do leito capilar e pela vasoconstricção arteriolar conseqüente à hipóxia e à hipercapnia12,9.
Prognóstico, e Tratamento Clínico e Fisioterapêutico
Os pacientes com enfisema pulmonar tornam-se gradativamente incapacitados, com conseqüente morte por insuficiência respiratória1.
O enfisema pulmonar não tem cura, portanto as medidas de tratamento têm por finalidades o alívio dos sintomas e a melhora da qualidade de vida dos pacientes12,1. Os objetivos do tratamento de pacientes com o enfisema pulmonar consistem em aliviar os sintomas e prevenir sua progressão. O uso de medicações como, corticóides ou broncodilatadores (por via oral ou inalatória), pode ser feito para se obter uma melhora parcial do quadro. O uso de broncodilatadores é mais eficiente em pacientes com bronquite crônica e asma, porém a terapia de reabilitação em pacientes enfisematosos pode ser bastante eficaz, pois ajuda os pacientes a usar sua energia de forma mais eficiente procurando fazer com que ocorra um menor gasto energético melhorando assim, sua qualidade de vida. Em casos de doença mais avançada a oxigenoterapia e as cirurgias redutoras de volume pulmonar (com retirada de áreas comprometidas do pulmão) podem ser realizadas. Para prevenir o enfisema pulmonar pode-se evitar o tabagismo e diminuir a exposição à poluição atmosférica.
O paciente com DPOC pode apresentar uma evolução clínica da doença por 30 anos ou mais. Sendo assim, a detecção precoce de alterações nas vias aéreas distais pode evitar o desenvolvimento da doença através da mudança no estilo de vida e no ambiente (STARR, 2004). O tratamento dos pacientes com DPOC visa a correção da hipoxemia, melhora da ventilação pulmonar, e o tratamento das condições desencadeadoras como o broncoespasmo e a infecção.
Recentemente há como tratamento cirúrgico do enfisema a cirurgia redutora de volume pulmonar. Esta é a retirada de áreas pulmonares que encontram-se mais afetadas pela doença, fazendo com que outras áreas menos comprometidas possam realizar as funções pulmonares de maneira mais adequada, ajudando também a melhorar a função diafragmática. O tratamento cirúrgico é feito em pacientes que apresentem grandes áreas de enfisema com dispnéia incapacitante pelo aprisionamento de ar e na ausência de alguma patologia importante das vias aéreas.
Os objetivos gerais da Fisioterapia respiratória em pacientes com DPOC são: facilitar a remoção de secreções; melhorar o padrão, o controle respiratório e a dispnéia; melhorar a postura; orientar o paciente quanto a sua patologia; melhorar a tolerância ao exercício. O tratamento deve ser direcionado para o estágio da doença em que se encontra o paciente, e à condição geral do mesmo.
Na reabilitação pulmonar a fisioterapia pode melhorar a qualidade de vida do paciente realizando: a reeducação do padrão respiratório; a remoção de secreções pulmonares; exercícios para toda a coluna vertebral, para evitar que o tórax fique fixo e com cifose torácica; e o controle da respiração a fim de melhorar a tolerância do paciente ao realizar exercícios.
Nos estágios finais da doença é importante que o paciente seja capaz de manter o máximo de independência e de função que forem possíveis. Durante as exacerbações deve-se enfatizar as técnicas de remoção de secreções e o controle respiratório. Em casos de insuficiência respiratória, a intubação traqueal, em ambiente de terapia intensiva, pode ser necessária, porém às vezes resulta em complicações como infecções pulmonares. A ventilação não invasiva com pressão positiva (VPPNI), pode ser indicada. A fisioterapia será necessária por curtos períodos, mas frequentemente durante o dia e algumas vezes à noite1, sendo importante sua atuação durante 24h nas UTI’s.
Uma meta análise sobre a utilização da VPPNI em I insuficiência respiratória aguda, baseou-se em quinze estudos prévios, controlados e randomizados, sendo oito que abordavam especificamente a exacerbação aguda de DPOC (grupo DPOC) e sete pesquisas apresentavam pacientes com DPOC e outras patologias (grupo misto). Comparou-se o uso da VNI ao tratamento convencional e observou-se que no grupo DPOC houve diminuição no índice de mortalidade e no tempo de internação hospitalar e em ambos os grupos ocorreu significativa redução necessidade de intubação oro traqueal14.
A ventilação mecânica pulmonar e necessária em cerca de 20 a 60% dos pacientes internados com DPOC, apresentando uma mortalidade hospitalar de 10 a 30%5.
Referências:
ABC DA SAÚDE. Enfisema pulmonar. Disponível em: http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?179.
Postado por: Dayse